Memórias

Memórias

domingo, 11 de outubro de 2015

Por vezes lembro-me...

Com a idade recordamos coisas recentes, mas são sempre as antigas que nos vêm mais á memória.
  Recordo que não consegui ser criança, a juventude foi de luta contra a pobreza envergonhada e, os primeiros anos de adulto foram vividos com sacrifício, labor e contenção na compra de utilidades que poderiam ajudar nos esforços diários.
  Na classe pobre a que eu pertenci desde o nascimento, fiquei no meu “destino natural”. A maioria vivia passivamente sem luta por um rumo diferente, aceitando o seu estado como uma fatalidade  e…o seu fado.
   Nos rebanhos de ovelhas há sempre as que se dispersam. Com o ser humano também se dá a debandada dos que não aceitam a condição a que o seu nascimento o destinou. Muitos não aceitam que o “pastor” lhe tente virar a rota, pois vêm no caminho escolhido como o correcto e que preenche parte dos seus sonhos.
  Na fuga que fiz para sair da precariedade em que vivia, tive que suportar muitas contrariedades. Desde a troça de colegas de trabalho, vizinhos, e de alguns “amigos" (“ali vai um burro carregado de livros” e outras frases de escárnio); as horas de descanso que não houveram; as condições económicas inexistentes e a falta de tempo para acompanhar aquela que tinha passado a fazer parte da minha vida, tudo aconteceu por largo período de tempo.

  Sinto pena dos jovens que hoje têm quase tudo e que quando deixarem a casa dos pais dificilmente vão ter as mesmas condições de vida. A imaturidade, ilusão da vida pelo que estão habituados e as carências que não têm tido, está a traçar-lhes um futuro de fracos e incapazes  para virem a ter uma vida com alguma qualidade. A falta de formação escolar, pessoal e/ou profissional será uma barreira para os menos lutadores e competentes.
  Sair da escola aos nove anos com a 3ª classe e começar a trabalhar, não é o indicado na época em que vivemos. Chegar a adulto e ter que ser trabalhador e estudante, deverá ser a necessidade de jovens, que ao irem para o mercado de trabalho, deparam com a falta do que na altura própria não quiseram ter.
   Sai da escola na 3ª classe, estudei como adulto e consegui uma parte do que queria. Enquanto menor (no “meu tempo” só aos 21 anos se era “maior”) não tive “oportunidade” de estudar; com a minha independência consegui alguns dos meus sonhos.
  Posso não ser velho, mas sei que por ser idoso, pouco mais posso do que por vezes lembrar-me...
 A.Rosa

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