Memórias

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quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Amargas recordações.

       O Tóino: - uma criança no seu começo de vida em trabalho remunerado (já tinha “treinado” em tarefas familiares).

   Estamos na época da apanha da azeitona, anos de 1950, em que a faina era feita com o varejar e ripar do fruto das oliveiras para grandes panos estendidos no chão em redor das árvores.
   Homens e mulheres ocupavam-se destes trabalhos, escolhendo-se os mais novos para poderem subir ás árvores. Outros tarefeiros recolhiam os frutos caídos nos panos para o local onde se fazia a sua limpeza, retirar folhas ou outros detritos, preparando a sua ida para o lagar.
   As azeitonas caídas fora dos panos não ficavam no local. Eram recolhidas por pessoas de mais idade e por crianças retiradas da escola. Passavam os dias debruçadas nesta recolha que era feita para cestas feitas de vimes ou de canas e despejadas periodicamente por outros trabalhadores. Claro que além de ter de fazes a apanha na sua área, cada um tinha que ter conteúdo na cesta ou não fosse haver cortes na “maquia” (seu vencimento ou complemento do mesmo, feito com feijão, grão, azeite ou frutos secos).

   Ao conjunto destas pessoas era dado o nome de “ranchos”, conduzidos por um capataz, homem responsável pelo desempenho de cada um e que tinha angariado toda esta gente na sua aldeia e arredores, colocando-as ao serviço do latifundiário, proprietário dos extensos olivais.
   Não fosse as agruras do tempo (frio, chuva e algumas trovoadas) e a alimentação que nos era entregue (couves cozidas com algum feijão e raras batatas, mas confecionados em panelões para matar a fome de 300/400 pessoas) a faina até era tolerada pelos homens e mulheres mais novos. Aos de idade avançada e às crianças, é que dava pena ver o sofrimento por que passavam.

   Com uma duração de 60 dias ou mais, havia os que tinham de abandonar o grupo por falta de saúde, pela dureza do trabalho para as suas condições físicas ou pelas gripes e pneumonias contraídas devido ao enxugar no corpo as roupas molhadas constantemente. O seu “descanso” nocturno era feito em camas de palha, estendida no chão de grandes pavilhões (um para os homens e outro para as mulheres) e que em nada ajudava os mais debilitados.

   O Tóino acompanhou os pais num destes “ranchos” sem poder ser cortado na “maquia” (valor em dinheiro e em leguminosas). Estava acostumado a ter uma má alimentação, mas um pouco melhor do que aquela, dada a sua confeção e higiene; engripou-se mas teve os mimos possíveis e cuidados da mãe, chorava por não poder continuar na escola, mas endureceu na sua vontade de que não era aquela vida que iria levar no futuro. Teve que esperar alguns anos, mas conseguiu parte dos seus objectivos, deixando de ser Tóino e utilizar o seu nome do B.I.



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